Tramas Sinceras

Série de pinturas em acrílico e baixo relevo sobre tela

Os escafandristas estão chegando...

Os escafandristas e mais 31 telas estão chegando ao Palacete das Artes para comemorar três décadas bem vividas da pintura do artista e arquiteto Chico Mazzoni. E nesta exposição, submersa em cores e tramas, o visitante vai conferir o trabalho do também restaurador, cenógrafo e designer, cujos traços irão prender a atenção, não apenas pelo detalhe da obra, mas pelo que ela transmite.

A mostra “Tramas sinceras” é uma homenagem às artesãs de Anatólia (Turquia) e uma reverência à vida. À vida que se tece. Para isso o artista brinca com imagens do cotidiano para transpor o movimento e sensualidade dos corpos, a contagem do tempo, a vaidade, a natureza, o urbano e o popular.

De bem com a vida, a maturidade faz muito bem ao trabalho de Chico Mazzoni. A sua obra traz uma construção plástica livre, leve, solta e bem humorada. E assim como o Palacete das Artes tem o prazer de recebê-lo, o público terá a oportunidade de se identificar com as pinturas, simples e sinceras, muitas delas dialogadas e revisitadas no dia a dia, sempre de forma elegante e bela.

MURILO RIBEIRO | Diretor do Palacete das Artes


Fiquei feliz quando soube que Chico Mazzoni iria expor no Palacete das Artes. Chico é um dos meus artistas preferidos e este é um ano muito importante para ele. Está completando 30 anos de trabalho em arte, que vem enfrentando com galhardia e muita perspicácia. Gosto especificamente da pureza do desenho, a quem Michelangelo chamava de ‘a alma da pintura’, e vejo em Chico um grande desenhista, dos mais promissores que já conheci. Sempre preocupado, sabe também que um artista não abre mão de qualquer assunto, até que o tenha explorado de toda forma.

Há dois anos, numa viagem à Turquia, teve a chance de presenciar ‘o jogo sábio de cores de mil filetes de mil tons, que não parecia pertencer ao mundo lógico da razão’, executado pelas moças que trabalham nos teares da Anatólia. Chico que já há muito vinha trabalhando a tinta especial, em baixo relevo, em lugar das pinceladas, para deixar luzir suas linhas e pontos, ficou encantado e nos encantou. São fiadas e mais fiadas que ele veste sobre seus temas, formando sombras e aspectos distintos, enquanto se balançam. Ele colocou suas tramas entre as das moças da Anatólia, tornando seu trabalho mais alegre e bonito, e prosseguiu nestes dois anos, com uma incumbência muito maior: inserir os elementos mais escuros, que precisam da luz para refletir.

Nesta mostra ele apresenta o que as moças de Anatólia jamais fizeram: Mazzoni consegue injetar profundidade sobre o que estava feito, dando às suas tramas o generoso efeito de sombras, como a de uma chuva fina, ou outro liquido. Até sem as sombras, como fazem as moças turcas, o processo já seria cativante, com o recurso das sombras, além de cativante será também feito pela primeira vez, o que espantaria até aqueles oriundos do lugar. Aumente cor e volume, inclua alguma coisa engraçada entre as tramas e viva a novidade, até na Anatólia! É uma coisa diferente que você aplica, para torná-la melhor. “Não tem porque temer, o que se aplica é novo também. A sombra não é só um complemento, é também provocativa.”

Trajetória

Chico descreve assim sua trajetória de arte: “Começando com desenhos muito puros, displicentes, fiz uma primeira mostra quase de improviso. (Chico Mazzoni – desenhos-1983). Fui então para a trama das imagens absolutas, puramente desenhadas (Imaginália-1984). Entrei em seguida na trama da cor (Arte –de- cor-1985). Arte feita só de cor, chapada, cristalizada, mas carente de ação o que me fez logo mergulhar no drama que o olho pode capturar. A cena pela ótica, a cinética, a semiótica (Cena&Ótica-1987), mas, neste ponto, a pureza do desenho começou a me faltar. Logo viajei para o ZEN (deZENho-1988), o essencial, o uno e nele só o desenho me redimiria e me ressignificaria. Das beligerâncias entre as formações de artista e de arquiteto resultaram as dicotomias expostas em Par ou Ímpar-1990, mostra das coisas e seus duplos ou seus opostos, concluindo o ciclo construtivo, até o surgimento da luz no fim do túnel, na mostra Por esta luz que me alumia-1995, de exclusiva pintura sobre tela. A trama da luz perdura até a exposição seguinte, Estação da Luz-1997, mas aí a pintura, aplicada agora com maior rigor, adquire solenidades para compor uma tessitura de entidades iluminadas. Essa tendência ao icônico, ao hierático, conduz-me ao arquetípico: os mitos. Aí fiz a exposição Milênios no ar-2000, um passeio sobre os mitos concretos (e também abstratos, como o olhar) e, para resolver as questões primordiais de minha identidade ítalo-brasileira, propus a Brasiliana-2003 – a primeira mostra exclusivamente temática. Deste mergulho venho à superfície e encontro a trama do pop que domina agora a expressão de um mundo globalizado (POP-UP-2006). Consolida-se a fase da tinta acrílica dimensional, com seu relevo e suas tonalidades cintilantes, que vai, gradativamente, aposentando os pincéis: o desenho rápido, saído do bico da bisnaga, solidifica-se em baixos relevos contrapostos a fundos chapados. Outro projeto, outro tema: as Cidades Invisíveis - 2010, revelando-me todos os vieses, arquitetônicos, urbanísticos, estéticos, psicológicos e críticos. TRAMAS SINCERAS constitui-se agora numa reflexão sobre as mostras realizadas nesta trajetória. Nela, além de revisitar temas, técnicas e linguagem, tento depurar tudo isto numa nova trama inédita, para cumprir minha função como artista. Comemorando os 30 anos em arte, a mostra compõe-se de 30 quadros inéditos, mais um, apontando para o futuro.”

Matilde Matos, 2013 (ABCA e AICA)

Série “COISAS PELAS QUAIS VALE A PENA VIVER”, 1,00 m X 1,00 m, Acrílica e acrílica em baixo relevo s/ tela, 2012